Os bastidores espirituais da Pátria do Cruzeiro
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Chico Xavier, através do espírito Humberto de Campos, traça os bastidores espirituais da história do Brasil, da inspiração dada aos portugueses para saírem ao mar e "descobrirem" a costa brasileira ao final do Século XIX, com a fundação da Federação Espírita Brasileira (1884) e a proclamação da República (1889), para provar que o destino manifesto para esta terra é ser o Coração do Mundo, a Pátria do Evangelho. Será?
A primeira vez que tentei lê-lo foi mais ou menos por volta de 2010, quando a economia "bombava", o céu era o limite e eu queria saber se este pedaço de terra estava realmente destinado a ser o farol do mundo, mas ainda não estava preparado. Achei viajante demais. Como assim Jesus estar amargurado a ponto de O Consolador precisar ser consolado por um anjo inferior hierarquicamente?
A segunda tentativa foi no final de 2018. Desnecessário contextualizar o plano geral pelo qual passávamos. Depois de tanto tempo "na jornada", acho que entendi. Ajudou muito um vídeo no qual o palestrante, Haroldo Dutra Dias, pede para prestarmos atenção ao prefácio do livro (o vídeo, aqui). De fato, Emmanuel escreve:
"Este trabalho se destina a explicar a missão da terra brasileira no mundo moderno. Humboldt, visitando o vale extenso do Amazonas, exclamou, extasiado, que ali se encontrava o celeiro do mundo. O grande cientista asseverou uma grande verdade: precisamos, porém, desdobrá-la, estendendo-a do seu sentido econômico à sua significação espiritual.
"O Brasil não está somente destinado a suprir as necessidades materiais dos povos mais pobres do planeta, mas, também, a facultar ao mundo inteiro uma expressão consoladora de crença e de fé raciocinada e a ser o maior celeiro de claridades espirituais do orbe inteiro.
"Se outros povos atestaram o progresso, pelas expressões materializadas e transitórias, o Brasil terá a sua expressão imortal na vida do espírito, representando a fonte de um pensamento novo (...)
"(...) a vós, meus filhos, que Deus vos fortaleça e abençoe, sustentando-vos nas lutas depuradoras da vida material." (p. 7/8, grifos meus)
Com este intuito, Humberto de Campos descreve, do ponto de vista espiritual e através de muitos floreios, os principais acontecimentos pelos quais este pedaço de terra passou, explicando cartesianamente o porquê deles ("isto" levou a "aquilo" por causa "disso"). Tiradentes? Morreu enforcado para redimir seu passado na Inquisição. Longinus (o soldado romano que espetou Jesus com sua espada) reencarnou como Don Pedro II para levar o país à maioridade espiritual. A escravidão? Para povoar o Brasil de raças africanas e moldar o Cruzeiro com sua humildade. Fernão Dias (o bandeirante), tinha uma nobre missão, apesar de ter assassinado o próprio filho e escravizar milhares de indígenas no caminho. E, de contradição em contradição, a narrativa segue.
Após a proclamação da República, os três últimos capítulos são um pouco "estranhos", pois há grande confusão entre passado e futuro, entre o plano já elaborado e cumprido de firmar aqui a Cruz do Evangelho e as "ameaças futuras" que poderão corromper nosso destino manifesto.
Por exemplo, há o chamamento de Jesus para que Ismael trabalhasse na unificação e organização de sua obra (o Evangelho através do Espiritismo), com o conselho de deter-se sobre a caridade, que "valerá mais que todas as ciências e filosofias, no transcurso das eras, e será com ela que conseguirás consolidar a tua Casa e a tua obra" (p. 198). Essa passagem exemplifica o papel secundário dado a Allan Kardec (citado em apenas 3 ocasiões, sem muita profundidade). Para intensificar o papel subalterno da fé raciocinada apregoada por Kardec, é explicitado o papel da Federação Espírita Brasileira como o polo irradiador da caridade no coração dos cariocas (e, consequentemente, dos brasileiros).
Pouco depois, na penúltima página, há um cavalo de pau de 360º para falar que o capitalismo é bom e o marximo é mau.
"Nesta época de confusão e amargura, quando, com as mais justas razões, se tem, por toda parte, a triste organização do homem econômico da filosofia marxista, que vem destruir todo o patrimônio de tradições dos que lutaram e sofreram no pretérito da humanidade, as medidas de repressão e de segurança devem ser tomadas a bem das coletividades e das instituições, a fim de que uma onda inconsciente de destruição e morticínio não elimine o altar de esperanças da pátria. Que o capitalismo, visando à própria tranqüilidade coletiva, seja chamado pelas administrações ao debate, a incentivar com os seus largos recursos a campanha do livro, do saneamento e do trabalho, em favor da concórdia universal." (p. 211)
Enfim, não é uma obra perfeita e está longe de ser considerada doutrinária. Resta apelar à interpretação pessoal de cada um. Se você acreditar que o fantasma do comunismo / socialismo / (coloque aqui qualquer outra ameaça que nunca será derrotada) ainda persiste e só por isso este pedaço de terra com este bando de gente em cima não se tornou um país de primeiro mundo, tudo bem.
Para mim, eu acredito que a Cruz já está firmada. Acredito que aqui é um hospital onde todo tipo de "coisa ruim" vem para se curar e, a partir do aprendizado recebido, nas próximas encarnações, servir como exemplo para a transição planetária. Relembre tudo o que foi destampado a partir de 2010/2013. Viver no meio deste umbral sem se abalar não é para qualquer um.
Lido em novembro de 2018
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Brasil, Coração do Mundo, Pátria do Evangelho
Chico Xavier, pelo espírito Humberto de Campos
Editora FEB (34ª Edição, 2015)
206 pgs
206 pgs
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