A Universidade dos Pés Descalços

Uma universidade para os pobres


Sanjit 'Bunker' Roy é um ativista social indiano que, em 1972, fundou a Organização Não Governamental "Universidade dos Pés Descalços" (Barefoot College) no vilarejo de Tilonia, na província indiana de Rajasthan. A Universidade dos Pés Descalços ensina mulheres e homens do meio rural, muitos deles analfabetos, a tornarem-se Engenheiros Solares, Artesãos, Dentistas e Médicos em suas próprias aldeias a partir dos usos e costumes locais.

Formado nos melhores colégios e universidades que a rúpia indiana pode pagar, Bunker Roy poderia escolher o emprego que quisesse (diplomata, professor, médico...) onde desejasse (Nova Deli, Paris, Zurique, Londres...), mas tocado pela fome que atingiu a população mais pobre da Índia nos anos 1960, decidiu trabalhar com os pobres e excluídos num vilarejo, Tilonia, no noroeste indiano (próximo à fronteira com o Paquistão).

Vencida a desconfiança inicial do anciãos de Tilonia, eles impuseram uma única condição à Bunker Roy, caso ele prosseguisse com a ideia de fundar uma universidade para os pobres: não trazer nenhum acadêmico ou especialista. Aceita a sugestão, foi criada a Universidade dos Pés Descalços (Barefoot College), a única universidade indiana onde a titulação de mestre e doutor te exclui automaticamente do quadro de professores. As principais exigências aos professores são: ser um inconformado, trabalhar com as mãos, mostrar que tem uma habilidade que pode ser ofertada na localidade e, o mais importante, estar comprometido na prestação de serviços à comunidade.

A Universidade dos Pés Descalços não fornece um certificado, não impõe limites de tempo para que seus 125 mil alunos concluam seus cursos e, além de não aceitar professores com Ph.D ou especialização, usa a linguagem corporal como meio de aprendizagem para que qualquer um possa aprender a construir coisas sem precisar ser alfabetizado.

O sistema formal de educação (alunos - sala de aula - quadro negro - material escrito) foi substituído por um processo informal, baseado principalmente no conhecimento tradicional dos povos da região. Isso faz com que seus alunos adquiram autoestima e comprometimento suficientes com suas comunidades para desencorajá-los a se aventurarem nos grandes centros urbanos em busca de maiores salários e "melhores" condições de vida.

Os princípios perseguidos pela Universidade dos Pés Descalços são: (1) igualdade: todos os membros são iguais, indiferentemente do sexo, classe, educação ou casta; (2) coletivismo: todos são envolvidos nos processos de decisão; (3) descentralização: sem qualquer hierarquia, as decisões cabem aos habitantes da localidade; (4) autonomia: a interação e o trabalho conjunto visa o desenvolvimento autônomo da comunidade; e (5) simplicidade: o objetivo final é a geração de uma comunidade familiar em um ambiente criativo e estimulante.

A ideia inicial de Bunker Roy era solucionar problemas como a educação das mulheres locais, a insuficiência de água potável, a inexistência de energia elétrica e o alto desemprego rural. Hoje, a Universidade dos Pés Descalços capacita mulheres (e apenas mulheres) de todas as partes do mundo para que aprendam um ofício sem que seja necessário alfabetizá-las. Numa segunda etapa, essas mulheres, ao retornarem a suas localidades, retransmitem o conhecimento adquirido a mais mulheres, se transformando em verdadeiros agentes multiplicadores de conhecimentos e transformações.

Todos têm seu papel definido e podem contribuir para melhorar determinada área de seu povoado e da Universidade. Por exemplo: o prédio da Universidade foi erguido por 12 "arquitetos" locais e ganhou um prêmio nacional. Quando os responsáveis pelo prêmio desconfiaram que não havia um arquiteto por trás do projeto, o pessoal da Universidade decidiu devolver o prêmio pela ofensa. Esses mesmos arquitetos foram responsáveis pelo sistema de abastecimento de água potável a partir da captação da água da chuva da Universidade e em seis comunidade vizinhas. A instalação, fabricação e manutenção do sistema de captação de energia solar da Universidade foi feita por um grupo de jovens aldeões com apenas o ensino fundamental.

No vídeo acima, numa palestra proferida no evento "TED Global", Bunker Roy conta essas e outras histórias, como a da avó afegã de 55 anos responsável pela eletrificação de mais de 200 residências da sua região em 5 anos que ensinou ao chefe do Departamento de Engenharia afegão a diferença entre a corrente alternada (AC) e corrente estacionária (DC) e a da menina de 12 que foi receber um prêmio na Suécia e, questionada pela rainha sueca, premida entre seus protocolos, quem era aquela criança cheia de desenvoltura, respondeu: eu sou a Primeira Ministra. 

Além da Universidade, há também 150 escolas para 75.000 crianças à noite. De manhã, elas cuidam de cabras, plantações, serviços domésticos. À noite, aprendem a ser cidadãos, a como medir a terra, ao que fazer quando um animal está doente etc. A cada cinco anos, as crianças de 6 a 14 anos se reúnem para  a eleição do primeiro ministro e de seu gabinete para definirem os rumos das escolas (e cobrarem o cumprimento das metas) durante seu mandato.

Definitivamente, uma ideia que vale a pena ser divulgada.

__________
Para saber mais:
Barefoot College (em inglês)
TED: ideas worth spreading (em inglês)

[ 001 ]

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...