Nunca acaba
Mário Ventura se considerava um cidadão de bem. Foi morto, segundo o seu ponto de vista, por culpa da negligência de um desqualificado. Na banda de lá, vagou por um bom tempo até encontrar alento num abrigo. Ele estava "lá", mas o seu pensamento continuava "aqui". Quando perdeu a paciência, resolveu fazer a sua justiça.
Neste instante, teve início a sua queda.
E caiu ainda mais, pois utilizou repetidas vezes suas novas habilidades de Executor para remendar o que julgava errado.
Perto do fundo do abismo, recebeu um conselho. Rejeitou. Recebeu outro. Ignorou. Estava tão cego pelo ódio que não estava receptivo a nada além dele. Então, no fundo do poço, teve sua última chance.
Neste instante, o livro se assemelha aos romances psicografados, pois começa a ser desvelada a teia de ódio-vingança-ódio-vingança secular que unia aquela meia dúzia de personagens. Porém, sem o proselitismo e a doutrinação desses, é mostrado, a seco, que você é o único responsável por seus atos, que não há atentado maior que aquele à justiça divina. Tudo tem o seu tempo de acontecer e não cabe a ninguém acelerar ou atrasar.
Apesar de não poder ser considerada uma pessoa iluminada, Mário não tinha afinidade com as trevas. Essa ligação só ocorreu quando foi tentado e aderiu com todas as suas forças ao ódio, no momento em que não estava mais na carne, o que demonstra que não descansamos em paz quando fechamos os olhos na banda de cá.
"Quantas tolices não têm cometido os tolos que julgam que o espírito não sofre dor alguma, a não ser aquelas dos seus mentais. Embora essas também existam, elas estão mais relacionadas aos reflexos condicionados da dor sofrida no corpo carnal e aos remorsos por erros cometidos do que com a dor do corpo espiritual.
"Esta sim é um tormento. Eu a vivi com grande intensidade e posso dizê-lo com toda a segurança: o corpo espiritual vibra tanto com a dor a ele infligida quanto o corpo carnal.
"(...) Primeiro, curaram minhas feridas, depois saciaram minha sede e só então vieram doutrinar-me para as coisas divinas.
"Sim, isso foi o que realmente despertou-me para a verdade. Não tentaram dobrar-me antes de me curar, e isso foi o princípio do meu despertar para a Luz. Não foi a vaga promessa do reino dos céus que me resgatou das Trevas, e sim o auxílio imediato às dores e aos ferimentos do meu corpo espiritual que me converteu de um ser cruel e violento, em alguém novamente bom e conformado com os reveses sofridos, tanto na carne como no espírito" (pp. 10/11)
Rubens Saraceni (1951-2015) iniciou seus estudos e desenvolvimento umbandista na década de 1980 e sua obra psicográfica teve início na década de 1990. Fundador do Colégio de Umbanda Sagrada Pai Benedito de Aruanda (1999), possui mais de 50 livros publicados, entre doutrinários, histórias romanceadas e de magia, e cerca de 30 ainda não publicados (!). A maioria versa sobre a Umbanda, mas muitos não guardam relação direta com a religião. Instruído por seus guias espirituais, fundou uma vertente da Umbanda, que foi denominada (por outros, nunca por ele) de Umbanda Sagrada.
Lido em Dezembro de 2017
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